Supremo considera constitucional modelo de trabalho intermitente

Por maioria, ministros aprovaram que trabalhador receba pelo período efetivamente trabalhado, quando convocado pelo empregador

O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucional o modelo de trabalho intermitente, instituído pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467) no ano de 2017. O placar, no Plenário Virtual, foi de oito votos a três.

A legislação só autoriza essa modalidade para atividades com alternância de períodos de prestação de serviço e de inatividade. O trabalhador recebe pelo período efetivamente trabalhado, quando convocado pelo empregador — que pode ser mais de um.

Os ministros analisaram os artigos 443 e 452 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que foram alterados pela reforma, por meio de três ações diretas de inconstitucionalidade (ADI 5826, ADI 5829 e ADI 6154).

No julgamento, o relator, ministro Edson Fachin, ficou vencido. Prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Nunes Marques. Para ele, o trabalho intermitente assegura os direitos mínimos dos trabalhadores, como valor da hora equivalente à do salário mínimo, descanso semanal remunerado, além de melhorar o padrão de proteção social aos trabalhadores que estavam na informalidade. Assim, acrescentou, não gera precarização, mas segurança jurídica.

Alexandre de Moraes também divergiu do relator, afirmando que o Legislativo tem autonomia para dispor sobre novas formas de trabalho, sem a obrigação de se manter fiel aos modelos tradicionalistas. “Mas obviamente o legislador sempre deve portar-se em observância aos direitos sociais consagrados constitucionalmente, e não me parece que aqui foi diferente”, afirmou.

Além deles, divergiram do relator os ministros André Mendonça, Cristiano Zanin, que propôs que o contrato seja rescindido após um ano de inatividade, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. Ficaram vencidas, por seguirem Fachin, as ministras Rosa Weber, hoje aposentada, e Cármen Lúcia.

O ministro Luiz Fux ficou com a maioria. Mas defendeu a “existência de omissão inconstitucional no regramento do contrato de trabalho intermitente”, que deve ser suprida pelo Congresso Nacional.

Segundo especialistas, a decisão do STF trouxe estabilidade e segurança jurídica para as empresas. Ricardo Calcini, sócio de Calcini Advogados, acredita que a decisão é um passo fundamental para que as empresas passem a adotar esse modelo com mais frequência. “Sem essa decisão, beirava a insegurança jurídica”, diz ele, acrescentando que as mudanças serão positivas para reduzir a informalidade e a precarização das relações trabalhistas.

Leticia Ribeiro, sócia trabalhista do Trench Rossi Watanabe, enxerga a questão pelo mesmo ângulo. Para ela, a validação de uma forma adicional de contratação, alternativa ao modelo CLT é positiva, pois permite a redução do desemprego e da informalidade. “Há um grande debate, já há algum tempo, sobre a necessidade de novas formas de contratação mais dinâmicas, e o modelo de trabalho intermitente não deixa de atender a esse anseio”, afirma.

Apesar disso, ela diz que os votos dos ministros Luiz Fux e Cristiano Zanin apontam para a necessidade de uma regulamentação infraconstitucional mais profunda, que traga melhorias para não deixar o trabalhador tão desassistido e ao mesmo tempo não inviabilize a contratação ao sobrecarregar o empregador.

“É necessário pensar em estruturas de contrato que considerassem a fixação de horas mínimas para o trabalho, por exemplo, ou com previsibilidade maior de renda. Sem esse número mínimo de horas trabalhadas, o salário pode ser insuficiente para a subsistência do trabalhador, que pode não conseguir alcançar a contribuição mínima para o INSS”, afirma.

Por outro lado, Ricardo Carneiro, sócio do LBS Advogadas e Advogados, acredita que o reconhecimento desse modelo vai precarizar “profundamente a relação de emprego”, ferindo o conceito de serviço efetivo de trabalho, que considera como parte da jornada o tempo que o trabalhador fica à disposição do empregador, aguardando ordens.

Para ele, há a possibilidade de uma “intensa migração de relações de emprego clássicas para essa modalidade precária de vinculação, que traz em sua essência o rebaixamento de renda, de direitos sociais e previdenciários e de condições de vida”.

Fonte: Valor Econômico – Por: Luiza Calegari