União poderá pagar mais créditos de PIS/Cofins com base na “tese do século”
Associações propõem a empresas aderir a ações coletivas, mas existem riscos
Um desdobramento da “tese do século” – que excluiu o ICMS do cálculo do PIS e da Cofins – pode deixar a conta a ser paga pela União superior ao valor estimado de R$ 358 bilhões. Empresas vêm sendo procuradas por associações e sindicatos com uma oferta tentadora: se filiar e, em troca, ter o direito de se beneficiar de uma ação coletiva que pode aumentar o volume de créditos tributários a receber.
Na maioria das propostas das entidades, as ações coletivas são mais antigas do que as ações individuais das empresas. Por isso, segundo advogados, haveria possibilidade de obter o direito a um volume maior de créditos. Contudo, eles alertam que há riscos a serem considerados.
Quando o contribuinte vence uma discussão sobre cobrança de tributos, tem o direito de receber de volta o que pagou a mais desde os cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação. Se entrou com o processo em 2015, por exemplo, é reembolsado desde 2010.
No caso da tese do século existe ainda uma peculiaridade. Quando o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o tema optou por modular os efeitos da decisão, limitando-os no tempo.
Contribuintes que ajuizaram ação até o julgamento de mérito (15 de março de 2017) têm o direito à restituição integral – desde os cinco anos anteriores à ação. Mas para quem ajuizou ação depois de 15 de março de 2017 a recuperação do passado ficou limitada. Uma empresa que entrou com o processo em 2018, por exemplo, só pode recuperar o que pagou de forma indevida desde 15 de março de 2017.
Essa sistemática reduziu um pouco a conta para o governo, mas ela ainda é alta. O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estima que a tese do século gerou R$ 358 bilhões em créditos tributários.
Agora, com a oferta de decisões coletivas, abre-se uma nova janela. A empresa que optar por aderir à proposta das associações e dos sindicatos poderá usar a ação coletiva para ter acesso a créditos que não seriam alcançados com a ação individual.
Existe pelo menos uma decisão sobre o tema. Foi proferida pela 1ª Vara Federal de Jundiaí (SP) em agosto do ano passado. Uma empresa do setor de alimentos foi à Justiça pedir para aproveitar os créditos fiscais por meio de uma decisão coletiva. O mandado de segurança foi ajuizado pela associação em 2006 e a empresa se filiou em 2021.
O juiz José Tarcísio Januário negou o pedido. Considerou que haveria violação à decisão do STF. Para ter acesso ao benefício, disse, a empresa deveria comprovar filiação anterior a 15 de março de 2017 – período que escapa da modulação de efeitos. Declarou que permitir o uso dos créditos “implica a possibilidade de verdadeiro comércio de decisões judiciais por associações com objeto genérico”.
Entre as empresas que aderem à filiação, existem duas situações: as que antes de usar os créditos preferem pedir autorização da Justiça – como no caso de Jundiaí – e as que optam por fazer a habilitação do crédito que entendem ter direito diretamente na Receita Federal.
Nessa segunda hipótese, contudo, os riscos são maiores. O Fisco tem até cinco anos para fiscalizar as compensações de créditos tributários feitas pelos contribuintes. Se entender de modo contrário à empresa, os tributos pagos com o crédito ficam em aberto e, além de arcar com juros e correção, terá que pagar multa.
Além dos riscos tributários envolvidos, haveria reflexos trabalhistas com a filiação, segundo Lopes. Para uma empresa cliente dele que recebeu a proposta, por exemplo, a mudança de sindicato demandaria ajustes internos.
Há ainda custos na filiação e no pagamento dos honorários de êxito para o advogado da associação ou do sindicato. Essa cobrança varia entre 20% e 30% dos créditos que se pretende recuperar e a maioria cobra no momento em que a empresa afirma ter interesse em usar a decisão.
Para o procurador Thiago Silveira, coordenador-geral da representação judicial da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STJ, a possibilidade de utilização dessas decisões coletivas gera manipulação do sistema e total desrespeito à modulação de efeitos do STF. “Certamente essa prática não será permitida”.
Silveira afirma que a procuradoria tenta combater também a atuação de associações que considera não ter legitimidade para representar os contribuintes. Uma delas, a Associação Nacional dos Contribuintes de Tributos (ANCT). “É um escritório de advocacia revestido de associação com milhares de ações ajuizadas em todos os tribunais”, diz Silveira, acrescentando que esse caso está no STF.
Fonte: Valor Econômico – Por Joice Bacelo